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Foto do escritorFelipe Schadt

Deixa eu te contar uma história sobre as minhas revistas Playboy


Capa da Playboy da Vera Fisher (imagem: Reprodução Playboy)

>No início da minha adolescência - lá pelos 12 anos - eu estudava em uma escola particular cheia de realidades que eu não conhecia. Era meu primeiro ano naquele colégio e eu tentava de tudo para me enturmar com os novos colegas. Eu era o tipo de menino que topava qualquer parada, comigo não tinha tempo ruim.


- Vamo jogar bola?

- Bóra!

- Vamo alugar uns filmes pra assistir la em casa?

- Não é de terror né? Então bóra!

- Vamos criar um grupo para planejar a dominação mundial por meio da revolta proletária?

- Bóra, camarada!


Como eu era o novato, essa característica foi importante para que eu pudesse ganhar popularidade na sala. Isso fez com que eu fosse muito requisitado na hora de fazer atividades em grupo, já que eu sempre estava disponível para realizar qualquer tarefa.


Um dia, o grupo dos meninos populares resolveram que era hora de eu fazer parte do clubinho deles. Era um trabalho de história sobre a guerra do Paraguai e, como eu particularmente mandava bem na matéria, os meninos populares me chamaram para fazer o trabalho com eles.


- A gente vai na minha casa amanhã depois da aula. Vamos almoçar na lanchonete aqui perto e depois ir para lá. Você vai né?

- Bóra! - Respondi sem pensar duas vezes.


Tive que implorar para a minha mãe me dar dinheiro para almoçar com os colegas. Eu não levava dinheiro par a escola, como eles faziam. Para eu estudar lá, meus pais e tios se juntavam para pagar a mensalidade, ou seja, eu era o garoto pobre e nerd na escola de rico. Bom... minha mãe entendeu a urgência do meu pedido e me deu uma generosa nota de 10 reais - que pra época era poderosa o bastante para comprar um X-Salada, uma lata de refrigerante, um chocolate e um belo de um sorvete.


No dia seguinte, a aula acabou e fomos até a lanchonete. Percebi que eles estavam completamente acostumados com o lance de "comer fora". Um deles até pagou a conta com um cartão de crédito, o que realmente me impressionou. Senti que aquele almoço era meio que um rito de passagem: "Ok, você tem dinheiro para comer um X-Salada, pode fazer parte do nosso grupo".


A casa do líder dos garotos era em um dos únicos dois prédios de Campo Limpo Paulista. Todo mundo que mora nessa cidade sabe da existência desses prédios, mas poucos já tiveram o privilégio de entrar, e um número ainda menor de pessoas o direito de viver ali. O Felipe de hoje sabe que ali é um apartamento comum, mas para o Felipe de 12 anos que só tinha visto aquela construção do lado de fora, era a casa mais legal do mundo. O dono da casa morava só com a mãe. Seus pais eram divorciados. A mãe estava trabalhando e, portanto a casa estava vazia. Eu queria fazer o trabalho logo, pois a minha intenção era sobrar tempo para sugerir que jogássemos video-game, a intenção dos meus colegas era outra.


- Galera, vocês trouxeram a parada né?


Todos fizeram que sim com a cabeça e eu fiquei assustado pela primeira vez. "Que parada? Do que eles estão falando? Será que é droga? Se for droga meu pai vai me matar" eu pensava enquanto a musiquinha do PROERD rolava no fundo da minha mente.


De repente todos começaram a abrir as mochilas e tiraram algumas revistas de dentro delas e entregaram para o dono da casa.


- Beleza. Vamo lá no meu quarto.


Eu não consegui ver que tipo de revista que era e eu só pensava em dizer "Ei! Deixa eu ver isso aí!" Mas não deu tempo, quando dei por mim, havia seguido os meninos para o quarto do dono da casa que, com um movimento teatral, abriu o guarda-roupas e mostrou a coisa que mais incrível que um menino na puberdade poderia ter: Pilhas e mais pilhas de revistas Playboy. O dono da casa percebeu meu espanto e perguntou ligeiro:


- Que foi? Nunca viu uma Playboy?

- Claro que já!

- Qual você viu? - ele me desafiou a responder.


O tempo parou e eu só pude lembrar da única vez que vi uma Playboy de perto. Foi na gaveta de um tio meu. Só consegui ver a capa, mas foi o suficiente para eu lembrar de quem era e responder:


- Vera Fisher!


Ele revirou a sua coleção impecavelmente arrumada e se dirigiu a mim


- Essa aqui? - me ofereceu a revista.


Ele estava ali, segurando a Playboy bem na minha frente e eu só tinha que esticar a mão e pegar.


- Essa mesma! - peguei a revista e foliei depressa até encontrar as fotos. Eu tremia.


Enquanto eu passeava por Paris com os pelos pubianos da Vera Fisher, os outros meninos disputavam a revista que continha o ensaio das Sheilas Melo e Carvalho, do antigo grupo É o Tchan! Acontecia que o líder do clubinho dos populares emprestava suas Playboys para os amigos abençoados.


- Quer levar quantas? - Perguntou pra mim.


Eu fiquei mais uma vez em choque. "Como assim levar para casa?"


- Já digo que se quiser a das Sheilas vai ter que esperar ou disputar no soco com eles.

- Eu não sei, mano... Acho que não vou levar não. Valeu!


E como um narcotraficante, o dono da casa ofereceu uma amostra grátis para que eu viciasse e vendesse minha alma para consumir seus produtos no futuro.


- Pode ficar com essa da Vera Fisher pra você. Não gosto muito dessa. E, vou te emprestar uma novinha que nem eu vi ainda, a revista da Kelly Key.


Eu recebia os presentes sem questionar, quando vi em uma das pilhas uma que realmente me chamou a atenção.


- Você tem a da Marisa Orth! Posso levar?

- Você gosta de maduras então? - ele disse com tom de brincadeira enquanto me dava a revista.

- Eu pago muito pau para a Magda do Sai de Baixo, sabe?


Ele fez que sim com a cabeça e continuou mediar as negociações com os outros meninos. Eu tinha três revistas na minha mão e eu só queria estar trancado no meu banheiro naquela altura do campeonato.


Não fizemos nenhum trabalho aquele dia e jogamos video-game o resto da tarde. Como forma de gratidão eu prometi que faria o trabalho todo e colocaria o nome deles. Ficaram tão agradecidos que antes de ir embora, me aconselharam a levar mais algumas revistas, todas elas de mulheres não muito famosas mas que davam de 10 a 0 em muita celebridade. Diziam eles que os ensaios fotográficos adicionais eram melhores que os principais. Eu ia fazer o que? Abrir a revista e dar uma de somellier de pornografia? Concordei e coloquei na mochila!


Eu me sentia muito bem. Fazia parte do grupo dos populares e de quebra, teria muito conteúdo para expurgar os meus hormônios adolescentes. Só havia um problema: "Como eu vou esconder isso em casa?". Como eu não tinha mais dinheiro para o ônibus, fui a pé com uma mochila pesada por conta das revistas. Era um caminho de 30 minutos, tempo suficiente para eu elaborar um plano que garantisse a permanência da Vera Fisher e companhia dentro de casa sem ser vistas por mais ninguém. Seria uma tarefa difícil...


Nessa época da minha vida, eu morava com meus pais e minha irmã em uma casa muito pequena e todos nós dividíamos o mesmo quarto. A privacidade era algo quase que inexistente. De todos os locais da casa, só havia um único lugar possível para guardar aquelas revistas: a última gaveta da cômoda. Essa gaveta eu guardava minhas roupas de frio e era a que a minha mãe tinha menos acesso. Escolhi um moletom velho que eu nunca usava e guardei as revistas dentro dele e o escondi debaixo de todas as roupas.


Embora minha mãe sempre tivesse se mostrado muito mente aberta para conversar comigo sobre vários assuntos, eu morria de vergonha só de imaginar que ela pudesse descobrir aquele conteúdo. Infelizmente, o sexo era um tema muito tabu para mim e a sensação de que eu estava fazendo algo errado era muito grande. Não houve um dia se quer que eu não fiquei tenso imaginando minha mãe pistola me esperando em casa com as revistas na mão pronta pra me dar um sermão.


Porém, o medo era proporcional à excitação que eu ficava quando, de maneira furtiva, eu ia até o quarto, escolhia uma das revistas, colocava ela debaixo da camiseta e entrava no banheiro. No começo eu demorava muito para escolher qual foto seria a ideal, mas com o tempo eu ja tinha as minhas preferidas para a "homenagem".


Aqui vale um parêntesis interessante. Na mesma época eu fazia teatro na escola (lembra? eu era o garoto que falava "bóra" pra tudo, inclusive para o convite de fazer parte do teatro) e obviamente existiam garotas muito atraentes e apetecíveis que faziam também. Um dia, um dos meninos mais velhos me disse:


- Nossa! Aquela mina é muito gostosa né? - se referindo a uma das nossas colegas de teatro

- É... - respondi timidamente

- Já homenageou ela?

- Oi? Homenageou? Como assim?

- Cara, pensa comigo. Como você se sentiria se soubesse que uma pessoa se masturbou pensando em você? Eu ia me sentir homenageado.


Aquilo fez muito sentido pra mim. Mais ainda. Aquilo aliviou a pequena dose de culpa que eu sentia quando homenageava alguém. Passou a não ser errado, sabe? Como pode ser ruim homenagear uma pessoa? Menos ruim ainda seria homenagear uma foto de uma mulher pelada que tirou aquela foto para justamente ser homenageada. Quando eu entrava no banheiro com uma das minhas revistas, eu estava apenas cumprindo o que se esperava de mim. Nessa relação existe a modelo, o fotógrafo, o vendedor da revista e o homenageador. Se eu não homenageasse, eu ia quebrar uma corrente de utilidade da revista. Iria quebrar a roda da pornografia. Eu tinha um papel a desempenhar.


Um mês depois de eu ter pego as revistas, sabia que eu tinha que devolvê-las para o dono. Ele tinha deixado claro que era um empréstimo. E pra mim também seria bom devolver, pois teria a chance de pegar novas revistas e homenagear mulheres diferentes.


Fiz toda uma força tarefa para colocar as revistas na minha mochila no dia anterior sem que ninguém em casa notasse. Coloquei elas dentro de um saco plástico para quando eu abrisse a mochila na escola, ninguém visse nada demais. Carreguei peso nas costas sem reclamar até a escola.


- E aí, mano. Beleza? Trouxe as paradas aqui pra te devolver. Depois da aula vamos pra sua casa né?

- Mano... eu não tenho mais revistas em casa. Dei tudo pros moleques. Esqueci de te chamar. - disse ele fingindo um lamento. - Pode ficar pra você essas aí.

- Mas... como assim? Porque você deu todas suas revistas?

- Porque eu transo agora. Perdi a virgindade e não preciso mais disso.


Eu fiquei ali parado enquanto ele saia de perto. Eu estava confuso. Primeiro que ele tinha só 12 anos e já tinha perdido a virgindade. Segundo que agora aquelas revistas me pertenciam. Terceiro que eu não fazia parte, afinal, do clubinho dos populares. Eles só queriam o trabalho sobre a guerra do Paraguai feito por algum trouxa - que no caso fui eu. Bom... as revistas foram um ótimo pagamento por esse serviço.


Três anos se passaram e eu continuava com as revistas escondidas na velha blusa de moletom no fundo da última gaveta da cômoda. Com o tempo, fui apreciando outras coisas da Playboy como por exemplo as entrevistas. A revista da Kelly Key tinha uma entrevista muito boa com o ex-técnico de vôlei, Bernardinho e outra sessão chamada "20 perguntas" com a saudosa Elza Soares. O fato é que mantive o meu relacionamento com a Playboy durante todo aquele tempo até conhecer a menina loira do teatro.


Já com 15 anos de idade, eu voltei a estudar na escola do meu bairro e, como eu já fazia teatro por bastante tempo, entrei com facilidade no grupo que tinha ali. Assim que eu entrei, eu a vi, uma moça loira com compridos cabelos cacheados, olhos claros e um corpo pra lá de apetecível. Adolescente né? Então me apaixonei na hora.


Todos os dias, praticamente, o grupo se reunia na casa de um dos atores para beber vinho barato na calçada e ouvir música. Foi nesse espaço que tentei aproximação. Não vou detalhar todos os passos que dei durante o flerte - que, acredite, duraram muitas semanas. O que posso dizer é que, depois de muito tempo e muito latim, eu e a menina loira começamos a ficar.


A medida que ficávamos, as coisas esquentavam mais e as revistas já não eram suficientes. Eu só queria homenagear uma pessoa. Ela! Com isso, as Playboys foram ficando esquecidas no seu esconderijo até o derradeiro dia que eu não iria mais precisar delas.


Perdi minha virgindade com a menina loira do teatro. Também não vou entrar em detalhes, mas o que eu posso dizer, é que foi incrível. Saí da casa dela em uma tarde de terça-feira aos pulos. Fora a sensação que foi muito boa, algo recaia sobre mim: "eu não sou mais virgem!"


A lobotomia que os jovens recebem na puberdade sobre a virgindade é muito complicada. Para nós, a humanidade era dividida em duas categorias: os que transavam e os virgens. Eu me senti no direito de só respeitar as pessoas que já tinham perdido a virgindade e achava que aqueles que ainda não tinha se relacionado sexualmente eram meras crianças.


Minha arrogância foi tão grande que uma vez pedi para um amigo meu que trabalhava numa gráfica imprimir um adesivo pra eu colocar no meu caderno. E sabe o que estava escrito no adesivo? "Aqui transa!". É... eu sei. O puro suco da escrotidão juvenil.


Como agora eu fazia parte da casta dos não-virgens, eu reproduzi a atitude do meu amigo que me deu as revistas. "Eu não preciso mais delas. Agora eu transo". Fui até a última gaveta da cômoda, desembrulhei as revistas de dentro do moletom velho e coloquei todas elas na capa do meu violão. Fui para o meio da rua onde uma molecada estava jogando bola. Fui pro meio do campinho imaginário deles e gritei.


- Ae, molecada. Cola aqui que eu tenho um presente pra vocês!


Abri a capa do violão e de repente o sol desapareceu. Várias cabeças se fecharam em volta de mim para olhar o conteúdo divulgado.


- Cada um pega uma e boa diversão.


Sabe quando você joga um pedaço de pão em um lago cheio de patos? Pois é. As revistas desapareceram em uma fração de segundos. E os moleques também. Todos correram para suas casas fazerem o que deveriam fazer: homenagear!


Dali eu fui encontrar os amigos do grupo de teatro e claro, a menina loira. Tínhamos engatado um namorico que me renderia mais um ou outro momento de fornicação. No final da tarde, já início da noite, resolvi ir embora. Quando estou descendo a rua da minha casa, avisto uma das crianças que pegou uma das revistas ao lado do que parecia ser o pai dela no portão da minha residência tendo uma conversa nada amistosa com a minha mãe. Na mão do pai furioso, a Playboy que ele havia confiscado do filho. Fodeu!


Dei meia volta. Meu coração tava na garganta! Eu era o aliciador de menores do bairro. Uma espécie de fornecedor de putaria que levou a molecadinha para a perdição do mundo promíscuo da pornografia impressa. Além disso, minha mãe teria descoberto que eu escondia Playboy em casa. Eu imaginava minha mãe pistola descontando toda a raiva que ela estava sentindo do sermão que ela ouvira do pai indignado em mim. A sensação que eu tive é que eu tinha sido pego após cometer um crime. Eu nunca cometi um crime, mas eu imagino que deveria ser aquela a experiência: o mundo sob seus pés simplesmente desaparece e a certeza da morte iminente te consome por inteiro.


Meia hora depois eu resolvi sair de onde eu estava escondido e olhar novamente para a rua da minha casa. Vazia. Era hora de encarar os fatos. Eu precisava voltar para casa uma hora e era melhor eu fazer isso antes que meu pai chegasse. Iria ser muito pior.


A cada passo perto de casa, eu elaborava uma desculpa. "Não era minha!", "Foi outro cara com uma capa de violão idêntica a minha que deu as revistas", "Eu só queria fazer a molecada feliz"...


Entrei em casa e minha mãe estava sentada no sofá pleníssima tricotando.

- Você não tem juízo na sua cabeça não?

- Eu? Juízo? Na minha cabeça? - me fiz de desentendido

- Fica dando revista de mulher pelada pra criança na rua, Felipe!

- Eles não são mais crianças, mãe! Para! Já têm idade para ver mulher pelada. - tirei coragem de não sei onde para responder.

- E de onde você tirou essas revistas.

- Achei elas esses dias aí e resolvi dar - menti

- Da próxima vez, de para alguém que não vai vir criar confusão no portão da minha casa.


Pera... "é isso?", pensei. Minha mãe não estava brava comigo. Estranhamente ela não ligava.


- O que aconteceu? - perguntei como se não soubesse.

- Ah... o pai de um dos meninos veio devolver a revista que você tinha dado pro filho dele.

- E cadê a revista.

- Guardei no lugar de sempre: dentro daquele moletom velho no fundo da última gaveta da cômoda.



Epílogo


E o pior de tudo é que duas semanas depois, e menina loira do teatro terminava o relacionamento comigo e demoraria muito tempo para eu voltar a me relacionar sexualmente com alguém. Ou seja, a Kelly Key foi homenageada muitas vezes por mim. -FS



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