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Um Web-LIvro de Felipe Schadt

Ilustrações de Jeckson Fernandes

A Novíssima República

Capítulo 8

"O Labirinto"

*Esta é um obra de ficção e qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência*

     Em um gabinete de uma delegacia de São Paulo, um agente da polícia encara o casal que está na sua frente. A mulher, uma senhora de pouco mais de 50 anos, está com um telefone celular na mão e um rosto apreensivo. Do seu lado, um homem com a mesma faixa etária com ar de cansado.

 

- Nada, senhora Franco? - Perguntou o policial.

- Não… - disse a mãe de Marcelo.

 

     Era a milésima tentativa de contato que ela fazia com seu filho que desaparecera depois da última vez que eles se falaram, segundos antes da policia aparecer na porta de sua casa. Pelo menos dessa vez o telefone de Marcelo chamava, mas ninguém atendia. Tinha sido instruída pelos policiais a tentar contato para poderem rastrear seu filho. Vimo Magalhães, primeiro delegado da região central de São Paulo, explicou para o casal que o filho deles era primordial para resolverem o problema ocorrido na Av. Paulista.

 

- Eu juro que meu filho não tem nada a ver com isso, senhor. - Tentou argumentar Angelo Franco.

 

- Nós sabemos disso, senhor Franco. Nós sabemos. - Olhou para ele com malícia. - O que me preocupa é ele ter sumido sem ao menos deixar qualquer tipo de aviso para vocês.

 

     Angelo congelou.

 

- O senhor não está insinuando que meu filho faz parte disso, está? - Retrucou Jane Franco.

- Não estou insinuando nada, minha senhora.

- Já disse que o cara do vídeo é meu bisavô. Ele realmente é a cara do meu filho. - Explicou Angelo.

 

- Eu também já entendi isso. O que eu não entendo são as coincidências em torno do seu filho. Um vídeo conspirando contra o governo é disparado no Réveillon pra todo mundo ver, o protagonista do vídeo é idêntico ao seu filho, quase uma hora antes do disparo do vídeo, seu filho saiu da casa que estava sem avisar ninguém para onde ia; depois do vídeo lançado, seu filho desaparece sem dar nenhum sinal. Vocês dois devem concordar comigo que isso está muito estranho.

 

     Jane não tinha como negar que o policial tinha razão em achar Marcelo suspeito de algo. Ela mesma já estava a ponto de acreditar que seu filho tinha envolvimento nisso. Maldito Apolo e suas teorias da conspiração. Amaldiçoou o falecido sogro por ter colocado na cabeça de seu filho tantas ideias malucas sobre o governo.

 

- Tente mais uma vez, senhora. - Disse o policial.

 

     Ela apertou o botão verde na tela de seu celular. Tum… Tum… Tum… Tum… Tum… Tum… Tum… Sua chamada está caindo na caixa postal de Marcelo Franco, deixe seu recado de voz ou de vídeo após o sinal.

 

- Nada ainda… - Resmungou Jane.

 

     Então uma batida na porta quebra o silêncio da sala. Um sujeito com cara de sono chama Vimo de canto e anuncia que o governador Privius está na delegacia. Vimo olha para o casal e pede para que eles esperem um pouco, pois precisaria se ausentar por alguns minutos. Sem nenhum tipo de protesto, o casal Franco continuou sentado pensando no que seu filho havia se metido. No corredor, Vimo buscava alguma desculpa para dar ao governador. Privius tinha ordens diretas do presidente para achar qualquer tipo de pista que pudesse prender qualquer um que tivesse envolvimento com o caso. Só que o delegado Vimo não era fã dos métodos usados pelos demais policiais.

 

    Em uma sala à esquerda do corredor, Privius esperava sentado num grande sofá de couro preto.

- Vimo, eles abriram o bico?

- Não senhor, senhor governador.

- Está usando métodos convincentes? - Disfarçou o tom de voz sarcástico

- Eles realmente não sabem o paradeiro do filho, senhor. Interroguei os dois e eles estão cooperando desde o início. E a história que contam bate com o resto.

- Você sabe que o presidente está no meu pé por isso, não sabe? Ele quer o rapaz custe o que custar. Torture os pais. Eles falarão alguma coisa. Se não quiser tocar na mãe dele, tente fazer algo com o pai.

 

    Vimo tentou manter a serenidade, mas toda vez que recebia ordens para torturar alguém, ele se enchia de ódio por ter que fazer aquilo. Sua maior habilidade era conseguir contornar a situação para não chegar nas vias de fato.

 

- O pai do rapaz é um patriota nato. Ele entregou o próprio pai para nós.

- Entregou o próprio pai?

- Sim! Há oito anos quando deflagramos uma quadrilha que traficava livros, recebemos uma denúncia que identificava um dos membros dessa quadrilha. Acredite se quiser, mas esse cara entregou o próprio pai para a polícia. O velho morreu dias antes do julgamento de um ataque cardíaco fulminante.

- E a esposa dele sabe disso? - Quis saber o governador.

- Nem a esposa e nem a sua mãe. Para todos da família, tanto a denúncia quanto a morte foram fatalidades na vida do velho. Então, se ele soubesse o paradeiro do filho, já teria falado.

- E o que vocês estão tentando fazer agora? - Disse Privius sem estar 100% satisfeito.

- Agora estamos tentando localizar o Marcelo através do celular dele, mas depois de ficar horas desaparecido e sem sinal, o celular chama, mas ninguém atende.

- Vimo, encontre esse cara!

- Estou fazendo o possível, senhor.

- E sobre a guarnição que foi até a agência dos correios? Alguma novidade?

- Eles ainda não retornaram, senhor. O guarda noturno de plantão não quis cooperar. Morreu sem falar nada.

- Resistiu às torturas?

- A todas elas. Os policiais devem estar apagando os vestígios disso nesse momento.

- Faça contato imediatamente, quero novidades sobre o outro suspeito. Eu tenho certeza que esse Marcelo e o cara da camiseta amarela estão juntos nisso.

 

     Na viatura roubada, Marcelo e Roberto estavam a caminho do hotel que Roberto estava hospedado quando o painel de comunicação do carro começou a tocar. Era uma chamada de vídeo da delegacia. Os dois se encararam sem saber o que fazer. Se atendessem o vídeo, os descobririam, se não atendessem, rastreariam a viatura e o achariam antes mesmo de eles chegarem ao hotel. Eles sabiam disso.

- Abra os vidros, Roberto! - Ordenou Marcelo.

- Mas por que?

- Abre logo a porra do vidro!

 

     Roberto fez o que Marcelo pediu e esperou pela próxima ação. Colocou o dedo em cima da câmera acoplada ao painel e apertou na tela o botão que aceitava a chamada. Na imagem, um sujeito de terno e gravata com um ar superior. Eles não sabiam disso, mas quem estava aparecendo no vídeo era o delegado Vimo Magalhães fazia contato.

 

- Sargento Lopes? Não vejo a imagem de vocês. A tela esta escura. - Disse o delegado.

- Senhor, não é a primeira vez que eu reclamo da manutenção dessa viatura, senhor! Mas o batalhão ignora todas as solicitações. Aí acontece isso aí… Preciso falar com a central e a câmera não funciona. - Dizia Marcelo forçando a sua voz tentando camuflá-la com o barulho do vento que entrava no carro graças às janelas abertas.

- Se eu conseguir entender o que disse, mande uma solicitação por escrito para mim amanhã que resolvo isso. Você não é o primeiro que reclama. - Concordou o superior do outro lado do vídeo.

 

     Roberto olhou espantado para a cena. Ficou impressionado com a capacidade de improvisação e atuação de Marcelo. O homem do vídeo continuou a falar.

 

- Arrumaram a bagunça que vocês fizeram na agência?

 

- Arrumamos, senhor. Deu trabalho desconectar todas as câmeras e fazer o download dos vídeos. Mas está tudo limpo.

- O que você disse? Não entendi a última parte.

- Está TUDO LIMPO, senhor!

- Copiado! Voltem logo para cá.

- Positivo, senhor!

 

     Marcelo estava prestes a desligar a chamada quando o sujeito engravatado o chamou mais uma vez.

 

- Que barulho é esse? As janelas do carro estão abertas? - Quis saber Vimo.

- Senhor, o calor está muito grande e o ar-condicionado da viatura também está com defeito, senhor.

- O que está com defeito?

- O AR-CONDICIONADO, SENHOR. Eu inclusive já fiz uma reclamação…

- Positivo sargento. - O detetive interrompeu Marcelo visivelmente irritado.

- É sério, senhor. Venho reclamando disso a dias. O senhor bem que poderia anotar aí as coisas que essa viatura precisa. Coisa rápida, eu tenho uma lista aqui. Eu falo para o senhor…

- Chega sargento! Venha logo para a delegacia. Câmbio e desligo!

 

     A imagem do detetive Vimo sumiu da tela. Agora eles tinham mais alguns minutos de folga antes que dessem falta dos verdadeiros policiais na delegacia.

 

 

     Ao chegar perto do palco onde antes estavam os artistas que animavam as milhares de pessoas presentes na agora vazia Avenida Paulista, Lisa Orsi percebeu o clima tenso no ar. Focou suas atenções para o computador e o conteúdo do chip USB que estava conectado à máquina. Com uma destreza impressionante, começou a digitar códigos no computador e a fazer uma série de comandos que abriam pastas, janelas e arquivos que por sua vez obtinham mais códigos numéricos que não desafiavam a gênio da informática.

 

     Após alguns minutos de avanços dentro de pastas, o computador simplesmente travou. Uma tela preta surgiu e, automaticamente, o vídeo do repórter em Paris começou a rodar. Como o computador estava desconectado de qualquer conexão de internet, inclusive de cabos que levavam o som do aparelho até alto-falantes, Lisa só conseguiu ver a imagem. Em resposta ao computador, ela digitou uma série de coisas no teclado e o computador voltou ao normal. Mas durou poucos segundos, pois a tela preta seguida do vídeo voltou a aparecer. Alguma coisa nesse chip está impedindo que eu acesse sua raiz e responde isso com o próprio vídeo.

 

- Viu só o que acontece? - Perguntou o capitão Carvalho. - Era exatamente isso que acontecia quando apertávamos o botão de resetar. Aparecia essa tela preta seguida do vídeo.

- É um tipo de vírus de defesa muito incomum. Ele serve como um buraco dentro de um labirinto que quando você cai, você volta para o começo. Mesmo que eu tente avançar aqui, vou ficar caindo em buracos e voltando para o começo da minha verificação.

- Não é mais fácil quebrar esse computador e tirar o chip fora?

- Seria se você quiser perder para sempre as informações do chip. Eu só vou conseguir saber mais sobre ele quando eu quebrar essa defesa.

- E do que a senhorita precisa?

- De um computador decente e uma série de outros componentes, como HDs externos, conexão com a internet e principalmente, tempo.

- Posso conseguir tudo isso para você, exceto o tempo. - Replicou o capitão. - De quanto você precisa?

- Pelos meus cálculos, de pelo menos duas horas.

- Te arranjo uma.

 

     Lisa revirou os olhos mas estava compenetrada demais para discutir.

 

- Passe para mim as especificações da máquina que você quer e dos demais componentes. - Ordenou Carvalho entregando-lhe uma folha de papel e uma caneta.

 

     Assim que Lisa terminou de escrever, o capitão Carvalho pegou o celular.

 

- Vou dar alguns telefonemas para conseguir suas coisas. Continue trabalhando no que você tem agora.

 

     Lisa já estava odiando o capitão e sua arrogância. Decidiu não se importar e voltar suas atenções para o computador que estava à sua frente. A cada tentativa de aprofundar na raiz do chip, mais ela caía na tela preta seguida do vídeo. E parecia que ficava cada vez mais difícil. A cada vez que era reiniciada para a tela preta, o estágio seguinte que tinha sido fácil na tentativa anterior, ficava um pouco mais complexo.

 

 

     Com insônia e sem muito o que fazer, Guto Boaventura estava derramado no sofá da sala de vídeo do Palácio do Alvorada. Estava ali lamentando todas as ações que deram errado naquela noite. O vídeo na Paulista, os suspeitos desaparecidos, a baixa adesão ao vídeo de Nico Mendes e a falta de informações sobre quem produziu e postou o vídeo na festa da virada do ano. Tudo isso, somado à sua posse, deixava o presidente reeleito extremamente ansioso. Resolveu relaxar no sofá para tentar pensar em algo, mas nada vinha. Como acabar com essa crise?

 

     Olhou para a grande televisão que habitava a enorme parede da sala. Pegou o controle remoto e começou a zapear. Passou por noticiários que tentavam acobertar a divulgação do vídeo na Paulista; um ou outro filme de ação; uns canais que exibiam entrevistas com lutadores de luta livre. Mas uma cena em particular fez Guto aumentar o volume da TV. Era um documentário que falava da possível fraude que foi a ida do homem à Lua em 1969. Há muitos elementos que comprovam a farsa que foi a ida do homem à Lua, como as sombras projetadas, as pegadas mesmo com gravidade próxima a zero, a bandeira americana tremulando… Guto se inclinou para frente e aumentou mais a TV para ouvir melhor o narrador do documentário. Mesmo naquela época, era muito simples, principalmente para a indústria americana de cinema, criar um cenário que simulasse a superfície da Lua no meio do espaço sideral. Fizemos o mesmo e construímos um cenário muito parecido com o que supostamente foi usado na época. Como podem ver, mesmo com a precária tecnologia de 1969, era possível enganar até mesmo os olhos dos mais atentos telespectadores. Agora imagina com toda a tecnologia presente nos dias atuais. Poderíamos fazer o homem andar pelos anéis de Saturno e todos acreditariam que de fato aconteceu.

 

     Guto se levantou e rapidamente e chamou um de seus assessores.

 

- Ligue para o Privius. Eu sei como vamos resolver isso.

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