*Esta é um obra de ficção e qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência*
Lisa Orsi chegou até o saguão do Hotel Hawkmoon. Um lugar todo de mármore que ostentava obras de arte, lustres, um belo piano de cauda e um balcão enorme com vários funcionários prontos para atender. Junto dela, um soldado estava segurando o computador com o chip USB. Rapidamente, um dos funcionários, um sujeito de terno e gravata com um cabelo cheio de gel, chegou até eles.
- Posso ajudá-los?
Lisa mostrou o cartão prateado. O funcionário tirou um pequeno scanner do bolso e scaneou o cartão. Um sinal verde acendeu e ele sorriu para Lisa.
- Por favor, me acompanhem. O quarto de vocês já está pronto.
Ela o seguiu, mas ainda não estava certa sobre aquilo. Será que trouxeram todos os equipamentos para um quarto de hotel? Era o que se perguntava. Decidiu não fazer perguntas até chegar em seu quarto. O silêncio permaneceu durante todo o trajeto e só cessou quando estavam na frente da porta com os números 268.
- Senhores, por gentileza. - Disse o funcionário abrindo a porta do quarto e dando passagem para os dois. - Aqui está exatamente tudo que foi solicitado, inclusive conexão com uma rede de internet criptografada. A senha está aqui. - Esticou o braço e deu um papel com uma sequência de números.
Assim que ela entrou no quarto, viu que ele parecia um laboratório de informática. Um computador com três telas, dois notebooks e toda a sorte de fios e cabos conectando todas as coisas.
- Vou deixá-los a sós. Use o interfone para qualquer coisa que precise.
Assim que saiu, Lisa pediu para que o soldado que a acompanhava montasse o computador que estava com ele perto dos demais equipamentos. O soldado obedeceu em silêncio e permaneceu assim de sentinela na porta.
- Você pode ir agora. Prefiro trabalhar sozinha.
- Sinto muito, mas tenho ordens para vigiar você. - Disse ele mantendo a postura.
- Eu não preciso ser vigiada. Eu só quero um pouco de privacidade para poder trabalhar em paz.
O soldado não se mexeu. Droga… Vou ter que aturar esse poste verde olhando pra mim a noite inteira.
- Já que vai ficar me vigiando, pelo menos me acompanhe no jantar. Vou pedir uma pizza.
Ele continuou em silêncio e mantendo a postura enquanto ela pegava o interfone.
- E aí? Algum sabor especial? Eu gosto de marguerita e você?
Nada.
- Vamos lá. Não vou contar para os seus superiores que você vai comer uma pizza comigo. - Esquece… ele não vai abrir a boca. - Ok. Uma pizza inteira de marguerita e dois refrigerantes, porque acredito que cerveja você não vai poder beber.
Discou o número da cozinha quando ouviu a voz do soldado.
- Gosto de guaraná.
Lisa sorriu e fez o pedido. Se aqueles equipamentos fossem os que ela havia pedido, não demoraria nada para desvendar os segredos daquele chip USB. Talvez ela conseguisse isso antes mesmo da pizza chegar no quarto.
…
No quarto 269, Roberto estava sentado na frente de um computador mexendo em comandos freneticamente enquanto Marcelo comia umas castanhas que havia encontrado próximo ao frigobar.
- O que viemos pegar aqui? - Quis saber Marcelo.
- Preciso salvar todos os dados desse computador e depois apagá-los.
- E quanto tempo isso vai demorar? Você sabe que precisamos ir até a casa dos meus pais.
- Não iremos até a casa de seus pais, Marcelo.
Aquilo o deixou furioso.
- Seu filho da puta! Você disse que iríamos ajudar meus pais! - Marcelo já estava indo para cima de Roberto quando ele se levantou e segurou o amigo pelo colarinho da farde de policial que ainda estava vestindo.
- Escuta aqui seu merda! Estamos há décadas preparando esse dia e você não vai estragar tudo por causa dos seus pais! Há muita coisa em jogo aqui, Marcelo e eu não vou arriscar a única chance que temos.
Marcelo tentou se soltar mas não teve forças o bastante. Roberto era incrivelmente forte e parecia extremamente estressado. Os dois se encararam e Roberto foi soltando Marcelo aos poucos.
- Desculpa por isso, cara. Mas não podemos ir até a sua casa. Ela com certeza deve estar cercada de policiamento. Se formos até lá, não encontraremos seus pais, como a sua amiga já tinha te dito e de quebra, seremos pegos. Não posso deixar eles te pegarem.
- Mas eu não sei de nada… Eu só odeio esse governo tanto quanto você e essa irmandade que vocês criaram…
- Você não sabe que sabe. Marcelo, me escuta. Seu avô era o único que acreditava no seu tataravô e você era o único que ele confiava. Seu tataravô deixou uma série de pistas que vão nos ajudar a destruir o governo. Essas pistas estavam sendo procuradas pelo seu avô, mas ele morreu antes de terminar. Ele te passou o bastão e você é o único que pode continuar o trabalho que seu tataravô começou.
- Mas meu avô nunca me falou nada…
- Ele falou muita coisa. Ele te ensinou muita coisa. Todas aquelas histórias que ele te contava na verdade eram pistas sobre as coisas que você deveria encontrar.
- Mas que pistas são essas?
- Não sei, Marcelo. Mas acreditamos que seu tataravô deixou para seu avô provas de que toda a história contada para esse país na verdade é uma mentira para manter os Boaventura no poder. A única coisa que temos é o vídeo do seu tataravô em Paris. Mas há mais coisas. Eu sei disso.
- Você sabe ou acredita que exista?
- Tenho que acreditar.
Tudo girava na cabeça de Marcelo. Ele tentou se lembrar das coisas se que avô lhe falava. Eram tantas que nem sabia por onde começar. Mas aquilo fazia sentido. Apolo, seu avô, sempre lhe falava sobre o tataravô e das teorias sobre o governo. Mas estava tudo bagunçado e ele precisava saber por onde começar.
- Não sei nem por onde começar a pensar, Roberto.
- Eu sei, cara. Assim que eu terminar esse backup, a gente vai para um lugar que vai te ajudar a refrescar sua memória.
- Onde?
- Na antiga casa dos seus avós.
…
Na delegacia, o delegado Vimo Magalhães não conseguia mais fazer contato com os dois policiais que haviam saído da agência dos Correios no Anhangabaú. Eles deveriam estar aqui há um tempo. Preocupado, não com os policiais, mas com o andamento da operação que buscava Marcelo e o outro sujeito de camiseta amarela, Vimo decidiu investigar ele mesmo. Foi até a sua sala, pegou sua arma e se dirigiu até o estacionamento da delegacia. Lá encontrou o governador fumando um cigarro.
- De saída, Vimo? - Quis saber Privius.
- Vou buscar alguma coisa para comer. Odeio a comida aqui dessa delegacia. Você quer alguma coisa?
- Não. Já estou indo pra casa. Os policias acabaram de me informar que o cenário já foi montado no quarto do Marcelo. Já orientei outros policiais em deixarem os pais dele sob custódia, mas preciso que você faça-os confirmar a nossa história.
- Qual história?
Privius tragou o cigarro e jogou o que avia restado dele no chão.
- Eles precisam apenas dizer que o filho não os deixava entrar no quarto e por esse motivo, não tinham como saber o que ele estava armando. Assim, tanto o pai quanto a mãe saem ilesos dessa história.
- Posso barganhar algo…
- Não haverá barganha, Vimo. Não podemos deixar nenhuma margem para o erro. As pessoas não podem saber que fizemos um acordo com eles. Eles terão que falar e sustentar a história. Ameace-os. Deixe claro que se não cooperarem as consequências serão piores.
- Verei o que faço. - Vimo não queria mais ouvir aquela conversa.
O governador chegou perto o suficiente para fazer o delegado sentir o cheiro de cigarro que saia de sua boca.
- Vimo… Se algo der errado no depoimento deles, eles não serão os únicos a sofrerem consequências graves.
Os dois ficaram se encarando por um instante até que o governador Normando Privius quebrou o gelo.
- Se eu fosse você não comeria coisas gordurosas a essa hora da noite. Elas podem te matar. Coma algo saudável.
Se afastou do delegado e entrou no seu carro. O ódio que Vimo sentia por aquele homem só aumentava, principalmente por saber que ele seria seu chefe pelos próximos cinco anos e ele não poderia fazer nada a respeito. A ideia de comer algo não era ruim, mas ele precisava investigar o paradeiro dos dois policiais que haviam sumido depois de terem saído dos Correios.
…
Uma leve batida na porta tirou a concentração de Lisa que estava mergulhada nos computadores tentando quebrar as barreiras contidas no chip USB. O soldado abriu a porta. Era a pizza e os refrigerantes. Havia passado cerca de uns 15 minutos desde que ela tinha iniciado o trabalho com o chip. Lisa não imaginava que seria tão difícil. Decidiu fazer uma pausa para poder comer, afinal, estava faminta. Pegou sua fatia na mão mesmo e ofereceu para que o soldado que nem sabia o nome pegar uma também. Ele olhou para os dois lados e se aproximou da caixa de pizza.
- Qual é, cara. Não tem ninguém te vendo daqui. - Ou tem?, pensou ela.
Ele se serviu e agradeceu, mas não quis se sentar junto dela. Ela deu um gole no seu refrigerante e ficou pensando em tudo que estava acontecendo. Teve uma ideia. Foi até o computador, abriu o arquivo do chip USB e deu play no vídeo. Ela ainda não tinha visto o vídeo todo. Na verdade, ninguém tinha. Desconectaram o computador com o vídeo ainda na metade. Não viu mal nenhum ver o que mais o repórter em Paris falava.
- Quer assistir comigo? - Percebendo o silêncio do soldado que comia a pizza, rebateu. - Tanto faz. Se não quiser assistir o vídeo, tape os olhos e os ouvidos.
O vídeo começou a ser executado. Vamos ver o que tanto eles temem.